segunda-feira, 12 de setembro de 2016

Apenas alguns números sobre a questão tributária

Estamos diante de um importante debate acerca de como faremos o ajuste fiscal. Acho que alguns gostariam de debater a necessidade de manter uma política fiscal expansionista dadas as restrições ao crescimento da economia brasileira. Mas, o desequilíbrio de hoje será pago em algum momento. Essa escolha deveria envolver o conjunto da sociedade, uma vez que o custo de rolagem da dívida pública é assustadoramente alto.
Como acredito ser imperativo fazer o ajuste fiscal, a pergunta é como? Regra geral ou aumentamos a receita ou cortamos a despesa.
Assunto longo, que deverá resultar em alguns posts neste blog, vou me dedicar neste momento a analisar a evolução das alíquotas de imposto de renda nos últimos anos.
Veja abaixo:

A tabela acima mostra os reajustes das alíquotas de Imposto de Renda nas diferentes faixas salariais. Assim, para o ano de 2007, a renda daqueles considerados isentos foi reajustada em 8%. Assim, se o salário de um indivíduo considerando isento no ano de 2006, for reajustado em 10%, ele passou a pagar a alíquota de 7,5% a partir de 2007. Mas, se a inflação fosse de 7%, este indivíduo permaneceria isento.
Desta forma, não podemos olhar essa tabela sem considerar a inflação.

Considerando agora os efeitos da inflação, vemos que até 2009 os reajustes da tabela eram superiores à inflação. Desta forma,  um número maior de indivíduos passava a recolher menos tributos do que no período anterior (aqueles no limiar de renda).
A partir de 2009, os reajustes da tabela foram um pouco superiores à inflação, fazendo com que mais indivíduos passassem a pagar impostos, crescendo a base tributária.
Mas, no ano de 2015 é que vemos uma grande diferença entre a inflação e o reajuste da tabela do imposto de renda. Imaginável a reação da população.



 

quarta-feira, 7 de setembro de 2016

Notas sobre Inovação e Taxa de câmbio

Muitas são as hipóteses apresentadas para explicar o resultado do investimento em inovação no Brasil. Sim, é necessário investir para inovar, seja dinheiro ou tempo, ambos escassos. Mas, falaremos de escolhas mais à frente. A industrialização tardia, a escassez de financiamento e seu custo, questões relacionadas ao marco regulatório, problemas de qualificação profissional são fatores utilizados como explicação para a inovação.
A questão então que se coloca é por que as empresas brasileiras não inovam? Uma das hipóteses repetida ao longo do tempo entendia que precisávamos de um choque de capitalismo. Que a estratégia substitutiva de importações, ao criar um mercado cativo e proteger as empresas locais desestimulou uma postura mais pró ativa nos empresários locais. Outra hipótese relacionava a fraca despesa com inovação às incertezas associadas à inflação. A impossibilidade de calcular o retorno esperado limitava as despesas em investimento fosse em inovação fosse em expansão da capacidade de produção.
Assim, nos primeiros anos após o Plano Real, expomos nossas empresas a um choque de mercado: reduzindo as alíquotas de importação, abrimos a economia e apreciamos o câmbio em um curto período de tempo, de 1988 a 1994. Entendíamos que as empresas locais responderiam ao novo ambiente ampliando gastos de investimento de forma a manter ou ampliar seu market share, mas isso não foi observado. Muitos economistas então passaram a relacionar o fraco desempenho com o que convencionamos chamar de tripé de política macroeconômica: a combinação de um câmbio flutuante, com metas de superávit primário e inflação, o que resultava em aperto fiscal e altas taxas de juros. Assim, entendia-se que estímulos fiscais poderiam reverter as expectativas deterioradas quanto ao crescimento da economia.
O período Lula, reverteria, portanto, a situação de aperto. Mas estava associado a um crescimento nos preços das commodities. O período de bonança foi aproveitado para melhorar a distribuição de renda e eliminar a dívida junto ao Fundo Monetário Internacional. Mas, não planejamos o futuro. Ao contrário, o crescimento do consumo inibiu a poupança e os investimentos produtivos. Mas, a poupança não é a única condicionante das inversões produtivas. A principal razão para realizar investimentos produtivos, sejam eles em inovação ou não, é a expectativa de lucros. 
A tentativa de reduzir juros forçadamente e implementar medidas de estimulo em um pacote de política industrial, que incluiu desoneração da folha de pagamento e uma renúncia fiscal expressiva, não resultou em ampliação de investimentos. Nenhum dos esforços resultou em reversão da situação de estagnação.
Vários são os tipos de inovação: de processo, de produto, tecnologia, mas apesar das diferenças de concepção eles têm algo em comum. São o resultado de investimento cujo resultado é incerto. Relacionar decisões de investimento à taxa de juros conjuntamente as expectativas foi uma das contribuições de Keynes, atribuindo à política monetária importante papel na definição e escolha da alocação de recursos. Mas, em momento algum discutiu-se a neutralidade da moeda diante de uma complexa arquitetura monetária global. A ausência de coordenação da política monetária, ou mesmo a impossibilidade de afetar preços globais para economias pequenas, altera a alocação de recursos.  Falar de depreciação cambial é extremamente impopular, seja por que evoca estratégias intervencionistas e protecionistas do passado seja por seu efeito sobre a inflação. Mas, a taxa de cambio fortemente apreciada, mesmo que leve a um equilíbrio da conta corrente, desestimula investimentos produtivos e os reorienta seja para países estrangeiros seja para setores onde temos vantagens competitivas.
As decisões de investir, sejam em expansão da capacidade produtiva, sejam na inovação de processos, de tecnologia ou de produto, dependem da expectativa de lucro.

Nos debates acadêmicos, consideramos o efeito da taxa de câmbio sobre a importação de máquinas e equipamentos e, assim, uma elevação da taxa de cambio inibiria investimentos produtivos. Muito embora a relação entre a variação do PIB, e, portanto, da demanda agregada, e a variação no estoque de capital desejado esteja consagrada nos modelos e argumentos do efeito acelerador, pouco se fala sobre uma possível relação positiva entre a taxa de câmbio, a demanda agregada e os investimentos produtivos.  
Mas, o que propomos aqui é uma relação inversa. É pensar em dois elementos. O primeiro é que é necessário colocar a taxa de câmbio no centro das preocupações de política econômica. O segundo é comprometer-se com uma regra.
Vamos entender por que. Há várias taxas de câmbio que podem ser consideradas relevantes, ou melhor há diferentes valores de câmbio e seu preço, fixado pelo mercado. Assim, calculamos qual seria a taxa de cambio capaz de manter o equilíbrio na conta corrente, o que significa não ter déficit ou superávit.
Calculamos também a taxa de cambio que denominamos paridade de poder de compra, que é aquela que iguala o preço de um produto produzido no exterior, por exemplo um Big Mac, com o preço do mesmo produto feito no Brasil. Vamos dar um exemplo: Considere que o Big Mac custe nos Estados Unidos o valor hipotético de US$8,00 e que no Brasil, o mesmo sanduiche custe R$ 24,00. Bem, a taxa de cambio que torna o preço em real equivalente ao preço em dólar é de R$3,00. Se comprarmos um destes sanduiches nos EUA estaremos pagamento o mesmo preço em reais que pagamos no mercado nacional. Consideramos esta taxa para comparar diferenças no custo e estilo de vida, mas, em lugar de utilizarmos um único produto, o fazemos com uma cesta de produtos. Assim, quando verificamos que a taxa de cambio corrente, ou o seu preço, torna mercadorias brasileiras mais caras, dizemos que há uma apreciação real da taxa de câmbio, diminuindo a competitividade das empresas brasileiras e, pior, tirando espaço no mercado interno ao tornar os produtos importados relativamente mais baratos.
O que precisaríamos fazer é calcular uma espécie de paridade de poder de competição internacional (PPCi), uma taxa de cambio que tornasse o preço em dólar competitivo para empresas brasileiras com sofisticação tecnológica, sinalizando para as mesmas que a inovação e compensada por retornos equivalentes a um investimento em outra nação. Claro está que temos diferenças de custo expressivas associadas à dificuldade logística, carga tributária, custos com mão de obra, etc.  E não se trata de corrigir diferenças de custo que estão associadas a ineficiências produtivas. Mas, se trata de estimular a eficiência que tem sido premiada com dificuldades crescentes de competir em função do câmbio. Assim, com uma taxa de cambio apreciada, desestimulamos aqueles que inovam e buscam produtividade e competitividade tirando-lhes tanto o acesso ao mercado doméstico como acesso ao mercado externo.

O IBGE pesquisa empresas para entender a relação das mesmas com a inovação. A última foi aplicada em 2014, mas os últimos resultados disponíveis referem-se a 2011.   A definição utilizada para inovação é: “Produto novo (bem ou serviço) é um produto cujas características fundamentais (especificações técnicas, componentes e materiais, software incorporado, user friendliness, funções ou usos pretendidos) diferem significativamente de todos os produtos previamente produzidos pela empresa.
Significativo aperfeiçoamento de produto (bem ou serviço) refere-se a um produto previamente existente, cujo desempenho foi substancialmente aumentado ou aperfeiçoado. Um produto simples pode ser aperfeiçoado (no sentido de obter um melhor desempenho ou um menor custo) através da utilização de matérias-primas ou componentes de maior rendimento. Um produto complexo, com vários componentes ou subsistemas integrados, pode ser aperfeiçoado via mudanças parciais em um dos componentes ou subsistemas. Um serviço também pode ser substancialmente aperfeiçoado por meio da adição de nova função ou de mudanças nas características de como ele é oferecido, que resultem em maior eficiência, velocidade ou facilidade de uso do produto, por exemplo.
Não são incluídas: as mudanças puramente estéticas ou de estilo e a comercialização de produtos novos integralmente desenvolvidos e produzidos por outra empresa. ”
De um universo de 17. 479 empresas selecionadas, 17% são consideradas empresas seguramente inovadoras, 63% com potencial inovador e apenas 20% sem indicação de potencial inovador. O período em que a pesquisa foi aplicada é especialmente interessante. Logo após a crise de 2008, com a economia crescendo e cambio fortemente apreciado.  Este resultado nos interessa especialmente pois a pesquisa anterior foi realizada quando o cenário era relativamente diferente. Apesar de apreciada, a taxa de câmbio estava relativamente depreciada se comparada a 2010. Cabe destacar que a escolha de inovar envolve custos cujo retorno é bastante incerto. Assim, as expectativas com relação ao cenário econômico tendem a afetar substancialmente esta escolha.
A apreciação cambial pode motivar novos investimentos e permitir acesso a tecnologia de ponta por meio de importação de novas máquinas e equipamentos. Mas, por que optar por uma estratégia de modernização tecnológica ou expansão da capacidade de produção se a mesma taxa de cambio que barateia o acesso a importações retira acesso ao mercado externo e ao mercado doméstico?
Uma apreciação cambial crônica, no longo prazo, promove a redução das margens de lucro das empresas do país, que deixam de poder exportar e perdem o mercado local em favor das importações.  
Na comparação entre os dois períodos, houve uma diminuição no número de empresas inovadoras. Assim, o percentual que era de 38,1% caiu para 35,6% o número de empresas inovadoras. Esse resultado parece apoiar a relação entre câmbio apreciado e investimentos em inovação. Destaca-se também a inovação de processos sobre a inovação de produtos visto que a primeira está relacionada a menores investimentos e menos incerteza quanto ao retorno.  Cabe destacar que o setor de serviços é o que apresenta a maior taxa de inovação quando comparado às indústrias selecionadas pela amostra da pesquisa.  Nos serviços considerados intensivos em conhecimento, a taxa de inovação em: “pesquisa e desenvolvimento (95,3%), desenvolvimento de software customizável (50,0%), outros serviços de tecnologia da informação (46,1%), e desenvolvimento de software não customizável (46,0%).”
A maior fonte de financiamento das empresas que empreenderam inovações é própria.

Impacto e grau de importância considerado alto da Inovação nas empresas

Fonte: Ibge, Pintec, 2011.


Em torno de 34% das empresas que empreenderam inovações receberam algum tipo de apoio do governo, como incentivos fiscais ou financiamentos. Do total das empresas 62% não implementaram inovações e, destas, 64% afirmam que não o fizeram em função das condições de mercado. Das empresas que afirmaram não terem inovado por outros fatores impeditivos, 43% afirmam que consideraram os riscos econômicos excessivos e 56% consideram os custos da inovação elevados. Das empresas que implementaram alguma inovação, 41% consideraram alta a importância de riscos econômicos, 51% consideraram os custos de inovação elevados, 43% afirmam que a escassez de fontes de financiamento e 49% afirmam que a falta de pessoal qualificado constitui elevado grau de importância como obstáculo à inovação.

Muito embora a incerteza e o risco inerentes à escolha de investimento em capital fixo estejam relacionados a inúmeros fatores como risco político, inflação, políticas discricionárias, entre outras, a variação cambial – medida pelo desvio padrão da taxa de câmbio comercial, como uma medida de risco e incerteza relevante para a escolha de investir em ativos fixos, cuja característica é a irreversibilidade. Assim, a depreciação recente tem baixo impacto sobre as estratégias de investir em inovação e em expansão produtiva face às oscilações cambiais. Ainda, a manutenção da taxa de juros elevada e a continuidade da política monetária norte americana, em que pese o anúncio de que esta será revertida, e a situação política nacional contribuem para expectativas de forte volatilidade cambial. 

Um pouco do que penso sobre a situação atual