Muitas são as hipóteses apresentadas para explicar o resultado do investimento em
inovação no Brasil. Sim, é necessário investir para inovar, seja dinheiro ou tempo,
ambos escassos. Mas, falaremos de escolhas mais à frente. A industrialização
tardia, a escassez de financiamento e seu custo, questões relacionadas ao marco
regulatório, problemas de qualificação profissional são fatores utilizados como
explicação para a inovação.
A questão então que se coloca é por que as
empresas brasileiras não inovam? Uma das hipóteses repetida ao longo do tempo
entendia que precisávamos de um choque de capitalismo. Que a estratégia
substitutiva de importações, ao criar um mercado cativo e proteger as empresas
locais desestimulou uma postura mais pró ativa nos empresários locais. Outra
hipótese relacionava a fraca despesa com inovação às incertezas associadas à
inflação. A impossibilidade de calcular o retorno esperado limitava as despesas
em investimento fosse em inovação fosse em expansão da capacidade de produção.
Assim, nos primeiros anos após o Plano
Real, expomos nossas empresas a um choque de mercado: reduzindo
as alíquotas de importação, abrimos a economia e apreciamos o câmbio em um
curto período de tempo, de 1988 a 1994. Entendíamos que as empresas locais
responderiam ao novo ambiente ampliando gastos de investimento de forma a
manter ou ampliar seu market share,
mas isso não foi observado. Muitos economistas então passaram a relacionar o
fraco desempenho com o que convencionamos chamar de tripé de política
macroeconômica: a combinação de um câmbio flutuante, com metas de superávit
primário e inflação, o que resultava em aperto fiscal e altas taxas de juros.
Assim, entendia-se que estímulos fiscais poderiam reverter as expectativas
deterioradas quanto ao crescimento da economia.
O período Lula, reverteria, portanto, a
situação de aperto. Mas estava associado a um crescimento nos preços das
commodities. O período de bonança foi aproveitado para melhorar a distribuição
de renda e eliminar a dívida junto ao Fundo Monetário Internacional. Mas, não
planejamos o futuro. Ao contrário, o crescimento do consumo inibiu a poupança e
os investimentos produtivos. Mas, a poupança não é a única condicionante das
inversões produtivas. A principal razão para realizar investimentos produtivos,
sejam eles em inovação ou não, é a expectativa de lucros.
A tentativa de reduzir juros forçadamente e implementar medidas de estimulo em
um pacote de política industrial,
que incluiu desoneração da folha de pagamento e uma renúncia fiscal expressiva,
não resultou em ampliação de investimentos. Nenhum dos esforços resultou em
reversão da situação de estagnação.
Vários são os tipos de inovação: de
processo, de produto, tecnologia, mas apesar das diferenças de concepção eles
têm algo em comum. São o resultado de investimento cujo resultado é incerto.
Relacionar decisões de investimento à taxa de juros conjuntamente as
expectativas foi uma das contribuições de Keynes, atribuindo à política
monetária importante papel na definição e escolha da alocação de recursos. Mas,
em momento algum discutiu-se a neutralidade da moeda diante de uma complexa
arquitetura monetária global. A ausência de coordenação da política monetária,
ou mesmo a impossibilidade de afetar preços globais para economias pequenas,
altera a alocação de recursos. Falar de
depreciação cambial é extremamente impopular, seja por que evoca estratégias
intervencionistas e protecionistas do passado seja por seu efeito sobre a
inflação. Mas, a taxa de cambio fortemente apreciada, mesmo que leve a um equilíbrio
da conta corrente, desestimula investimentos produtivos e os reorienta seja
para países estrangeiros seja para setores onde temos vantagens competitivas.
As decisões de investir, sejam em expansão
da capacidade produtiva, sejam na inovação de processos, de tecnologia ou de
produto, dependem da expectativa de lucro.
Nos debates acadêmicos, consideramos o
efeito da taxa de câmbio sobre a importação de máquinas e equipamentos e,
assim, uma elevação da taxa de cambio inibiria investimentos produtivos. Muito
embora a relação entre a variação do PIB, e, portanto, da demanda agregada, e a
variação no estoque de capital desejado esteja consagrada nos modelos e
argumentos do efeito acelerador, pouco se fala sobre uma possível relação
positiva entre a taxa de câmbio, a demanda agregada e os investimentos
produtivos.
Mas, o que propomos aqui é uma relação
inversa. É pensar em dois elementos. O primeiro é que é necessário colocar a
taxa de câmbio no centro das preocupações de política econômica. O segundo é
comprometer-se com uma regra.
Vamos entender por que. Há várias taxas de câmbio
que podem ser consideradas relevantes, ou melhor há diferentes valores de câmbio
e seu preço, fixado pelo mercado. Assim, calculamos qual seria a taxa de cambio
capaz de manter o equilíbrio na conta corrente, o que significa não ter déficit
ou superávit.
Calculamos também a taxa de cambio que
denominamos paridade de poder de compra, que é aquela que iguala o preço de um
produto produzido no exterior, por exemplo um Big Mac, com o preço do mesmo
produto feito no Brasil. Vamos dar um exemplo: Considere que o Big Mac custe
nos Estados Unidos o valor hipotético de US$8,00 e que no Brasil, o mesmo
sanduiche custe R$ 24,00. Bem, a taxa de cambio que torna o preço em real
equivalente ao preço em dólar é de R$3,00. Se comprarmos um destes sanduiches
nos EUA estaremos pagamento o mesmo preço em reais que pagamos no mercado
nacional. Consideramos esta taxa para comparar diferenças no custo e estilo de
vida, mas, em lugar de utilizarmos um único produto, o fazemos com uma cesta de
produtos. Assim, quando verificamos que a taxa de cambio corrente, ou o seu
preço, torna mercadorias brasileiras mais caras, dizemos que há uma apreciação
real da taxa de câmbio, diminuindo a competitividade das empresas brasileiras
e, pior, tirando espaço no mercado interno ao tornar os produtos importados
relativamente mais baratos.
O que precisaríamos fazer é calcular uma
espécie de paridade de poder de competição internacional (PPCi), uma taxa de
cambio que tornasse o preço em dólar competitivo para empresas brasileiras com
sofisticação tecnológica, sinalizando para as mesmas que a inovação e
compensada por retornos equivalentes a um investimento em outra nação. Claro
está que temos diferenças de custo expressivas associadas à dificuldade
logística, carga tributária, custos com mão de obra, etc. E não se trata de corrigir diferenças de custo
que estão associadas a ineficiências produtivas. Mas, se trata de estimular a
eficiência que tem sido premiada com dificuldades crescentes de competir em
função do câmbio. Assim, com uma taxa de cambio apreciada, desestimulamos
aqueles que inovam e buscam produtividade e competitividade tirando-lhes tanto
o acesso ao mercado doméstico como acesso ao mercado externo.
O IBGE pesquisa empresas para entender a
relação das mesmas com a inovação. A última foi aplicada em 2014, mas os
últimos resultados disponíveis referem-se a 2011. A
definição utilizada para inovação é: “Produto novo (bem ou serviço) é um
produto cujas características fundamentais (especificações técnicas,
componentes e materiais, software incorporado, user friendliness, funções ou usos pretendidos) diferem significativamente
de todos os produtos previamente produzidos pela empresa.
Significativo aperfeiçoamento de produto
(bem ou serviço) refere-se a um produto previamente existente, cujo desempenho
foi substancialmente aumentado ou aperfeiçoado. Um produto simples pode ser
aperfeiçoado (no sentido de obter um melhor desempenho ou um menor custo)
através da utilização de matérias-primas ou componentes de maior rendimento. Um
produto complexo, com vários componentes ou subsistemas integrados, pode ser
aperfeiçoado via mudanças parciais em um dos componentes ou subsistemas. Um
serviço também pode ser substancialmente aperfeiçoado por meio da adição de
nova função ou de mudanças nas características de como ele é oferecido, que
resultem em maior eficiência, velocidade ou facilidade de uso do produto, por
exemplo.
Não são incluídas: as mudanças puramente
estéticas ou de estilo e a comercialização de produtos novos integralmente
desenvolvidos e produzidos por outra empresa. ”
De um universo de 17. 479 empresas selecionadas,
17% são consideradas empresas seguramente inovadoras, 63% com potencial
inovador e apenas 20% sem indicação de potencial inovador. O período em que a
pesquisa foi aplicada é especialmente interessante. Logo após a crise de 2008,
com a economia crescendo e cambio fortemente apreciado. Este resultado nos interessa especialmente
pois a pesquisa anterior foi realizada quando o cenário era relativamente
diferente. Apesar de apreciada, a taxa de câmbio estava relativamente
depreciada se comparada a 2010. Cabe destacar que a escolha de inovar envolve
custos cujo retorno é bastante incerto. Assim, as expectativas com relação ao
cenário econômico tendem a afetar substancialmente esta escolha.
A apreciação cambial pode motivar novos
investimentos e permitir acesso a tecnologia de ponta por meio de importação de
novas máquinas e equipamentos. Mas, por que optar por uma estratégia de
modernização tecnológica ou expansão da capacidade de produção se a mesma taxa
de cambio que barateia o acesso a importações retira acesso ao mercado externo
e ao mercado doméstico?
Uma apreciação cambial crônica, no longo
prazo, promove a redução das margens de lucro das empresas do país, que deixam
de poder exportar e perdem o mercado local em favor das importações.
Na comparação entre os dois períodos, houve
uma diminuição no número de empresas inovadoras. Assim, o percentual que era de
38,1% caiu para 35,6% o número de empresas inovadoras. Esse resultado parece
apoiar a relação entre câmbio apreciado e investimentos em inovação. Destaca-se
também a inovação de processos sobre a inovação de produtos visto que a
primeira está relacionada a menores investimentos e menos incerteza quanto ao
retorno. Cabe destacar que o setor de
serviços é o que apresenta a maior taxa de inovação quando comparado às
indústrias selecionadas pela amostra da pesquisa. Nos serviços considerados intensivos em
conhecimento, a taxa de inovação em: “pesquisa e desenvolvimento (95,3%),
desenvolvimento de software customizável (50,0%), outros serviços de tecnologia
da informação (46,1%), e desenvolvimento de software não customizável (46,0%).”
A maior fonte de financiamento das empresas
que empreenderam inovações é própria.
Impacto
e grau de importância considerado alto da Inovação nas empresas
Fonte: Ibge, Pintec, 2011.
Em torno de 34% das empresas que
empreenderam inovações receberam algum tipo de apoio do governo, como
incentivos fiscais ou financiamentos. Do total das empresas 62% não
implementaram inovações e, destas, 64% afirmam que não o fizeram em função das
condições de mercado. Das empresas que afirmaram não terem inovado por outros
fatores impeditivos, 43% afirmam que consideraram os riscos econômicos
excessivos e 56% consideram os custos da inovação elevados. Das empresas que
implementaram alguma inovação, 41% consideraram alta a importância de riscos
econômicos, 51% consideraram os custos de inovação elevados, 43% afirmam que a
escassez de fontes de financiamento e 49% afirmam que a falta de pessoal
qualificado constitui elevado grau de importância como obstáculo à inovação.
Muito embora a incerteza e o risco inerentes
à escolha de investimento em capital fixo estejam relacionados a inúmeros
fatores como risco político, inflação, políticas discricionárias, entre outras,
a variação cambial – medida pelo desvio padrão da taxa de câmbio comercial,
como uma medida de risco e incerteza relevante para a escolha de investir em
ativos fixos, cuja característica é a irreversibilidade. Assim, a depreciação
recente tem baixo impacto sobre as estratégias de investir em inovação e em
expansão produtiva face às oscilações cambiais. Ainda, a manutenção da taxa de
juros elevada e a continuidade da política monetária norte americana, em que
pese o anúncio de que esta será revertida, e a situação política nacional
contribuem para expectativas de forte volatilidade cambial.