segunda-feira, 10 de outubro de 2016

Mais sobre a PEC 241

20 anos...... Resolvi olhar os números da Execução Fiscal do Tesouro Nacional.

Houve uma queda de 4% na Receita Bruta acumulada de Janeiro a Agosto de 2016 quando comparada a igual período do ano anterior. Queda maior, de 5%, na receita administrada pela Receita Federal. Explicada em grande parte por uma queda de 9% na arrecadação de imposto de renda. 
As transferências por repartição de receita caíram na mesma proporção. Apesar disso, a receita líquida sofreu uma diminuição de 3%.
Já a Despesa Total caiu apenas 1%, ampliando o déficit e o desequilíbrio fiscal. As despesas com benefícios previdenciários cresceram 2%. É possível esperar que continue crescendo. Assim, um teto para as despesas pode incentivar mudanças nas regras da previdencia. Inocente é acreditar que estas mudanças serão feitas nos benefícios públicos. Houve uma queda de 1% nas despesas com Pessoal e Encargos Sociais. Não tenho números sobre a quantidade de servidores contratados no período. Mas, acredito fortemente que o corte nesta despesa se dá evitando seu crescimento nominal, digo melhor: evitando o crescimento salarial dos servidores públicos. Novamente é inocente imaginar que os salários do legislativo e do judiciário se reduzam. Dado o teto, imagino que a despesa com salários de professores e servidores com fraca organização devem se reduzir. 
O Fundeb (complem. União) se reduziu em 21%. 
O resultado final é assustador.  O resultado primário no período de Jan-Ago de 2015 era deficitário em -R$14,8 bilhões e passou para -R$57,7 bilhões. Um crescimento de 288%. 
Como visto acima, a evolução das Receitas constitui importante fator explicativo para o crescimento do resultado primário deficitário. Assim, não parece razoável supor que apenas o controle da evolução das despesas seja o suficiente para controlar o desequilíbrio das contas públicas. 
Talvez o uso de indexadores diferentes para a Receita e para a Despesa do Governo tornem esta uma tarefa mais fácil. Mas, a aposta em um aumento na Carga Tributária vai se intensificando. 
Assim, a PEC 241 fixa o teto das despesas em valores elevados. Não garante o equilíbrio orçamentário (As receitas caíram mais que as despesas). Não contem a evolução da dívida/PIB (veja o crescimento no pagamento dos Juros Nominais abaixo). Não garante utilização racional dos recursos públicos. Tira do Estado Brasileiro o poder de utilizar a política fiscal de forma discricionária em uma economia que opera ciclicamente pelo período de 20 anos. Tira o foco do compromisso com a geração de resultado primário para conter a evolução da dívida pública. Potencializa a formação de grupos de pressão canalizando a despesa para aqueles que se organizarem melhor e não para despesas consideradas prioritárias como política de governo. 
Cabe aqui fazer uma consideração sobre os Juros Nominais. Há uma hipótese implícita de que a despesa com Juros nominais cresce com o aumento na dívida. Mas, ocorre que a despesa com juros nominais cresce quando aumenta a inflação (Remuneração dos títulos  indexados pelo IPCA e IGP) e quanto o Banco Central decide aumentar a taxa básica de juros (Remuneração dos títulos pós fixados). Assim, a redução do déficit primário e mesmo a geração de um superavit primário podem não resultar em menor gasto com juros nominais. 
O crescimento das despesas com juros nominais foi de 18%. E, as despesas com juros nominais no período de Janeiro a Agosto de 2016 são de 74% da Receita líquida descontada a arrecadação liquida para a RGPS. 
Em tempo, o ajuste fiscal pode conduzir a uma queda no PIB em velocidade maior que a diminuição do déficit/dívida pública. Assim, a exemplo da Grécia, as medidas contracionistas podem elevar a relação dívida/PIB. 
Por fim, não consigo compreender por que a preocupação com a execução fiscal tem que ser uma Emenda Constitucional e por que 20 anos? Por que não 100 anos? 

Qual a racionalidade econômica na PEC 241?

Há, de fato, um grave problema fiscal a ser resolvido. O que está em jogo é o equilíbrio orçamentário e a trajetória da dívida pública. Assim, alcançar a estabilidade é fundamental para evitar um aumento na carga tributária no futuro ou cortes mais expressivos. Isso posto, entendeu-se que colocar um teto sobre os gastos garantirá o equilíbrio. Bem, isso não é verdade. Um teto sobre os gastos garante apenas que a despesa não cresça para além da inflação. Ou seja, ano a ano é possível votar no congresso um orçamento com gastos compatíveis com a receita sem que seja necessário colocar as despesas públicas em uma camisa de força.
Se o projeto for aprovado temos alguns cenários possíveis:

1. A despesa cresce acompanhando a inflação e a receita cresce acompanhando o PIB nominal. Ou seja, haverá um crescimento das receitas acima das despesas. Isso vai garantir uma diminuição no déficit primário e, possivelmente um superávit primário. Manteremos o déficit nominal.
2. A despesa cresce acompanhando a inflação e a receita cai em função de uma queda no PIB nominal. Ou seja, manteremos o déficit primário pois as despesas crescem mais que as receitas. Não se garante equilíbrio orçamentário. Ampliaremos o déficit nominal.
3. A despesa cresce acompanhando a inflação e a receita cresce acompanhando a inflação (crescimento do PIB real igual a zero). Neste caso, haverá uma manutenção do déficit primário.

Ainda, temos que ressaltar a seguinte peculiaridade brasileira: parte da dívida pública é indexada ao IPCA e ao IGP, e parte cresce de acordo com a SELIC. Assim, um aumento na inflação aumenta a despesa com juros nominais. Desta forma, mesmo com um resultado primário positivo podemos ver crescer a relação dívida/PIB.

Controlar despesas sem controlar o gasto com juros nominais é inútil. Dado que ultimamente se compara as contas públicas com o orçamento das famílias, vou fazer uma analogia: é como você controlar os gastos da sua família enquanto o banco lhe cobra juros cada vez maiores. Sua dívida não cai, mesmo fazendo um esforço enorme em controlar seu orçamento.

O compromisso com uma meta de superávit primário me parece mais razoável se o objetivo é alcançar o equilíbrio das contas públicas. Se há um teto a discutir, este deveria ser o pagamento dos juros nominais. Gastamos em torno de 30% da receita líquida com o pagamento dos juros nominais (dados da Execução Financeira do Tesouro Nacional).

Se não for aprovado, minha leitura é de que temos um congresso maduro o suficiente para rejeitar colocar as despesas do governo em uma camisa de força. Forte o bastante para resistir às pressões políticas do momento. Mas, entendo também que é necessário deixar claro que há compromisso com o equilíbrio fiscal. 

Há vários problemas com a proposta na forma como ela foi encaminhada: a mensuração do IPCA  - o IBGE está para divulgar uma nova Pesquisa de Orçamento Familiar. Uma mudança na ponderação dos itens de despesa do índice pode aumentar substancialmente a inflação e corrigir para cima as despesas do governo em itens cujo crescimento dos preços ficar abaixo do índice. Vinte anos é um prazo demasiadamente longo para uma economia cíclica. É claro que teremos problemas de execução e discricionariedade de política fiscal. Isso pode deteriorar mais as expectativas de mercado do que melhorá-las. 

Quanto aos gastos com Educação e Saúde, bem, estas são despesas sociais fundamentais. Estamos tratando da sobrevida dos brasileiros e do futuro dos pequenos brasileiros em idade escolar. Colocar mais dinheiro nestas rubricas não garante uma melhora na qualidade destes serviços. Mas, e se for necessário gastar mais para melhorar o atendimento? Isso significará cortes de gastos em outras rubricas. Como é muito difícil cortar folha de pagamento, estamos falando de cortes de despesa de investimento e racionalizar gastos com despesas correntes. Bem, gastar adequadamente a receita pública (ou seja, racionalizar gastos com despesas correntes) deveria ser a regra!!!!!!!!!! 

Minha avaliação é de que esta foi uma proposta apressada e que considera a dificuldade deste governo em conseguir compromisso do Congresso com um orçamento equilibrado. 


quarta-feira, 5 de outubro de 2016

PEC 241



A PEC 241 é uma estratégia de contenção dos gastos públicos confortável no sentido de que evita negociações, discussões e compromissos em torno do equilíbrio orçamentário. A ausência de flexibilidade orçamentária pode ser uma solução paliativa e de curtíssimo prazo. Contudo, ela esgarça o tecido social e as relações políticas fortalecendo grupos de pressão no futuro, tornando insustentável a manutenção da regra no longo prazo. 

Mas, a preocupação com o equilíbrio orçamentário é legítima e deve ser respeitada!


O ideal seria alterar a regra orçamentária e vincular o orçamento a uma regra de produtividade.  Vou dar um exemplo, se uma unidade do governo se compromete com o atendimento de 100 indivíduos e não cumpre, não poderá solicitar o mesmo valor de orçamento para um próximo exercício. Atualmente, o orçamento de um ano se baseia no valor do ano anterior acrescido da inflação (essa é uma simplificação grosseira, mas, o orçamento tende a se reproduzir de um ano para o outro).


Torna-se cada vez mais importante enfrentar definitivamente a necessidade de uma reforma tributária e a redução de juros. Ou seja, acredito que estamos perseguindo a agenda de política econômica errada. 


Congelar os gastos por 20 anos pode gerar precarização nos serviços públicos, já que o valor empregado não acompanhará a demanda do crescimento da população.Trata-se de uma regra simples mas equivocada. Mesmo que congelássemos os gastos em termos reais seria um equivoco. Afinal, é possível fazer a mesma coisa de forma mais produtiva e sobrar recursos também.
Acho importante olharmos os dados da execução orçamentária para refletir sobre nossas alternativas. Nós gastamos em torno de 20% da receita bruta com o pagamento de juros nominais (dados da Execução Financeira do Tesouro), ou seja, um quinto da arrecadação bruta federal está comprometida com juros, reduzindo nossa capacidade de gastar com educação, saúde, infraestrutura, etc.  Se considerarmos a proporção dos juros em relação à receita líquida (depois das transferências a estados e municípios) reduzida da receita administrada pelo Regime Geral de Previdência Social, temos um comprometimento médio (de janeiro a junho de 2016) de 35% com o pagamento de juros. Um terço dos recursos do governo federal se destinam a pagar juros reduzindo nossa capacidade de investir em infraestrutura e em realizar gastos sociais tão necessários em uma nação tao desigual.

Mas, não podemos simplesmente parar de pagar os juros. A questão é reduzir essa proporção ao longo do tempo. O não pagamento dos juros penaliza também o pequeno investidor e a família poupadora. Portanto, precisamos pensar na redução da despesa com juros ao longo do tempo convergindo para patamares compatíveis com práticas internacionais.