domingo, 17 de julho de 2011

Rumo incerto

No passado, os países em crise em função de seu elevado endividamento público eram economias pequenas, incapazes de afetar a renda mundial e o nível de preços. Amargamos anos de políticas econômicas equivocadas. Gerações interrompidas. Décadas perdidas em busca de solução. Ao final, um pronunciamento do então secretário do Tesouro norte americano, Nicholas Brady, pareceu ser um luz ao fim do longo túnel. Percebia-se que as políticas recessivas inviabilizavam a capacidade de pagamento da dívida. E, em um discurso relativamente simples, anunciava-se que se os credores quizessem receber de volta os recursos emprestados deveriam socorrer e ajudar os devedores. Em bom português, arrume emprego para a pessoa a quem você emprestou o dinheiro! O acordo que permitiu o deságio na dívida externa veio acompanhado de abertura dos mercados, reformas e novas possibilidades de realização de ganhos. Pergunto-me: será que os credores ficaram satisfeitos com o acordo?
Bem, décadas depois, vivemos situação mundial parecida. A semelhança está no endividamento e nas medidas recessivas. Mas, para por ai. São economias grandes, capazes de afetar o crescimento mundial e preços internacionais: Estados Unidos, Espanha, Itália e os pequenos Grécia, Irlanda e Portugal.
Há semanas estamos assistindo a agonia da Grécia, as dificuldades de Portugal, a urgência na Itália e o desgaste político do presidente Obama. No conjunto as propostas são equivalentes. Cortes de gastos que incluem novos pactos previdenciários, cogelamento de salarios de servidores públicos, menor despesa com saúde, etc. Questiona-se a sustentabilidade de um Estado forte com contratos sociais em que prevalecem gastos sociais e políticas de bem estar social.
Parece-me claro que um orçamento equilibrado é o recomendável em todos os tempos e que o desequilíbrio orçamentário é resultado de um Estado fraco, incapaz de arrecadar o suficiente e pressionado por realizações de pesados gastos. Mas, os desequilíbrios atuais resultam não apenas da fraqueza do Estado. Resultam basicamente de mais dois outros motivos: 1. Com a crise e seu impacto recessivo as receitas tributárias cairam resultando em dificuldade de pagamento da dívida e 2. Estruturas de oferta pouco produtivas seja por deficiência no sistema de ensino, seja por acordos rígidos no mercado de trabalho. Desta forma, a incapacidade de aumentar a produção exige no curto prazo políticas que estimulem a demanda agregada como forma de elevar o PIB e a arrecadação.
Outra diferença entre a crise de endividamento atual e a passada é a forma de financiamento utilizada pelos países endividados. No passado as economias latino americanas e africanas recorreram a empréstimos contratuais junto a credores internacionais e, domesticamente, recorreram a emissões monetárias desencadeando processos inflacionários. O equacionamento da dívida requeria fortes ajustes no balanço de pagamentos para gerar superávits capazes de pagar ao menos o serviço das dívidas e audaciosos ajustes fiscais para conter a emissão monetária e os processos innflacionários que impediam (entre outras coisas) a geração de superávits externos. Na atualidade, os países endividados utilizaram-se de emissões de títulos fazendo crescer a dívida mobiliária e não a contratual. Por sua natureza, a dívida em títulos pode ser repassada com maior facilidade a agentes econômicos com menor aversão a risco. Não há como conhecer a extensão e o perfil de quem hoje detém esses títulos. Portanto, um default ou a mera possibilidade de um default tem potencial de impactar um número infinitamente maior de agentes econômicos e países. Eis por que nesta semana que passou estávamos apreensivos esperando o resultado dos testes de stress a que vários bancos europeus foram submetidos. Os testes acalmaram um pouco as expectativas mais alarmistas. Contudo, não afastam a possibilidade de um contágio e uma crise maior.
Estamos diante de uma situação muito mais complexa portanto. Seja em função do tamanho das economias endividadas, seja em função da razão do endividamento, seja em função da integração do mercado financeiro e possibilidade de contágio. Isso significa que, apesar da crise não se localizar geograficamente em países como o Brasil, podemos sofrer com as consequencias dela!
Diante da gravidade da atual situação, a adoção de políticas recessivas aponta para um cenário não desejável. A geração de superávits primários garantem a possibilidade de pagamento da dívida mas, não resolve os problemas estruturais que a causaram. Além disso, essas medidas resultam em queda no desempenho econômico e, portanto, na arrecadação tributária fazendo com que sejam necessárias novas medidas de ajuste.
Parece-me portanto que a capacidade de articulação política e o enfrentamento dos problemas estruturais é que devem ser observados no presente momento!

Nenhum comentário: